Levantamento inédito do MapBiomas identificou 2869 pistas de pouso no bioma

Em um trabalho inédito, o MapBiomas identificou 2869 pistas de pouso na Amazônia, mais do que o dobro das pistas contidas nos registros da ANAC. Pelas coordenadas geográficas, 804 pistas de pouso, ou 28% do total, estão dentro de alguma área protegida: 320 (11%) ficam no interior de Terras Indígenas e 498 (17%) no interior de Unidades de Conservação. Ficam a até 5 km de distância de um garimpo, ou menos, 456 dessas pistas, ou 15,8% do total contabilizado. No interior de Terras Indígenas, esse percentual é maior: no caso da TI Yanomami, 33,7% das pistas estão a 5 km ou menos de algum garimpo; na TI Kayapó, esse percentual é de 34,6%; na TI Munduruku, 80%.  

O ranking das pistas em Territórios Indígenas coloca as TIs Yanomami (75 pistas), Raposa Serra do Sol (58), Kayapó (26), Munduruku (21) e o Parque do Xingu (21) na liderança. A correlação com o avanço do garimpo na região é inequívoca: as Terras Indígenas mais exploradas pelo garimpo foram a Kayapó, na qual 11.542 hectares foram tomados pelo garimpo até 2021, seguida pelo território Munduruku, com 4.743 hectares e a terra Yanomami, com 1.556 hectares.  Os dados são do último levantamento do MapBiomas sobre garimpo e mineração no Brasil. As Unidades de Conservação com maior número de pistas de pouso, por sua vez, são a APA do Tapajós (156 pistas), a Flona do Amaná (53), a APA Triunfo do Xingu (47) e a Floresta Estadual do Paru (30).

>> Acesse o documento com o mapeamento das pistas de pouso e garimpo na Amazônia

Os estados com maior quantidade de pistas de pouso na Amazônia são Mato Grosso (1062 pistas), Pará (883), Roraima (218) e Tocantins (205). Mas é no Pará que ficam os quatro municípios com mais pistas de pouso: Itaituba (de onde sai 81% do ouro ilegal do país, segundo estudo da UFMG em cooperação com o MPF), São Félix Do Xingu, Altamira e Jacareacanga com 255, 86, 83 e 53 pistas, respectivamente.  Quando as pistas são classificadas por bacia hidrográfica, a lista é liderada pelas bacias do Tapajós (onde o garimpo tingiu as águas de Alter do Chão e onde estudos já comprovaram a contaminação por mercúrio dos ribeirinhos rio acima), com 658 pistas; Xingu, com 430 pistas; Madeira, com 356 pistas; e Negro, com 254 pistas.

“Há um problema logístico intrínseco ao garimpo, em especial dentro de Terras Indígenas e Unidades de Conservação, onde não há grandes rotas de acesso terrestre ou fluvial. Isso exige o acesso aéreo para abastecimento do garimpo e escoamento da produção ilegal. Seja por helicópteros ou aviões de pequeno porte, por pistas ilegais ou pistas legais cooptadas pelo crime, grande parte da produção garimpeira amazônica é feita por via aérea. Portanto, identificar essas pistas de pouso encravadas na floresta Amazônica é tarefa essencial para estrangular o garimpo ilegal”, explica Cesar Diniz, doutor em Geologia e coordenador técnico do mapeamento da mineração no MapBiomas. “Esta base de dados, pública e gratuita, de localização das pistas de pouso, sejam elas legais ou ilegais, dentro de toda a extensão do bioma Amazônico visa auxiliar o trabalho de acabar com as pistas clandestinas e o garimpo ilegal”, completa.

Em 2021, o bioma Amazônico concentrou mais de 91% do garimpo brasileiro. Nos últimos 10 anos, uma expansão da área de garimpo em Terras Indígenas (TIs) foi de 625%, saltando de pouco mais de 3 mil hectares em 2011, para mais de 19 mil hectares em 2021. Nas Unidades de Conservação (UCs), o cenário não é diferente: a expansão de área garimpada foi de 352% em 10 anos, saltando de 20 mil hectares em 2011 para pouco mais de 60 mil hectares em 2021.

Ao menos 12% (23 mil hectares) da área de garimpo do Brasil é ilegal pois encontram-se dentro de Terras Indígenas ou Unidades de Conservação restritas a essa atividade (UCs de Proteção Integral, RPPN e RESEX) e não há nenhuma linha em nossa constituição que permita a existência de garimpos nessas áreas. Para se ter ideia, essa extensão (23 mil hectares) equivale à área de uma capital como Recife, em Pernambuco.  “A quantidade de pistas e consequentemente, de aeronaves em uso pelo garimpo, bem como o maquinário pesado empregado na atividade, indicam que o garimpo amazônico não é mais artesanal”, destaca Tasso Azevedo, coordenador geral do MapBiomas.

O mapeamento das pistas de pouso foi realizado pela Solved, que também lidera o mapeamento de Mineração, Aquicultura e Zona Costeira no MapBiomas. Ele oferece uma base de dados pontual (feita por pares de coordenadas X-Y), que foi construída por interpretação visual de imagens alta resolução (4 metros de resolução – Planet), a partir de mosaicos mensais de 2021 e, em sua primeira versão, sem dissociação entre pistas autorizadas ou não-autorizadas. “O levantamento será continuamente atualizado e, a cada nova versão, alcançará melhor refinamento espacial e detalhamento de seus metadados, até que o delineamento das pistas, status de regularização, extensão, idade de criação, distância à TI ou UC mais próximas e o principal uso ou cobertura do terra associados a pista, estejam incorporados à base”, explica César.

“No começo da década de 1990, o país foi capaz de organizar a retirada de mais de 30 mil garimpeiros ilegalmente instalados dentro de Terras Indígenas na Amazônia. É preciso repetir esse feito, mas é preciso ir além, sofisticando a capacidade de rastrear a cadeia produtiva do ouro, geolocalizando o maquinário pesado, que é sempre utilizado pela atividade garimpeira, monitorando em tempo real os sinais de expansão garimpeira em TIs e UCs restritas e protegendo, permanentemente, esses territórios. É igualmente importante controlar a venda de mercúrio metálico, substância que é ilegal, mas, apesar disso, é largamente comercializada para fins garimpeiros. Também será necessário recuperar os ecossistemas degradados”, recomenda Tasso Azevedo. 

>> Para visualizar os dados, acesse: https://plataforma.brasil.mapbiomas.org/pistas-de-pouso

>> Os dados das pistas de pouso estão disponíveis também no arquivo shapefile. Baixe aqui